Terminou
ontem, 2 de setembro, a exposição Rubem Braga – O fazendeiro do ar, que esteve em cartaz no Museu da Língua Portuguesa desde junho e que a Produção
Literária visitou no último sábado, 31 de agosto. Rubem Braga, renovador da
crônica brasileira nascido em Cachoeiro de Itapemirim (ES) no dia 12 de janeiro
de 1913, recebeu essa grande e justíssima homenagem em comemoração ao seu
centenário e que segue agora para o Rio de Janeiro, para ser instalada no prédio
da antiga Rede Manchete.
Disposta em
cinco módulos, a exposição buscou abraçar as principais facetas desse homem. De início, um salão coberto do chão ao teto com reproduções de edições do Diário Carioca e do Correio da Manhã – jornais em que Rubem Braga atuou – trazia mesas
com máquinas de escrever, imitando o ambiente de uma redação de jornal de meados do século passado. Cada uma das mesas mostrava uma daquelas facetas,
entre elas: o Homem, apresentando um pouco de sua vida pessoal; o Andarilho, lembrando
suas viagens tanto no Brasil quanto no exterior; o Editor, dispondo exemplares
de obras publicadas pela Editora do Autor, que dirigiu em parceria com Fernando Sabino e Walter Acosta, e também alguma correspondência
que manteve com os autores que publicou; o Escritor, trazendo suas próprias
obras; e o Repórter, mostrando seus trabalhos tanto no jornalismo político
quanto como crítico de Arte. Abrindo as gavetas, o visitante podia encontrar
alguns “extras”: objetos pessoais, manuscritos e fotografias. Sobre algumas
máquinas de escrever havia tablets que, acionados pelas teclas das mesmas
máquinas, apresentavam trechos de crônicas, reportagens e depoimentos.
No módulo
seguinte, dedicado à época em que Rubem Braga atuou como correspondente junto à
Força Expedicionária Brasileira durante a Segunda Guerra Mundial, ainda num
ambiente coberto de jornais do teto ao chão, uma longa mesa com vários
telefones antigos ocupava a sala. De um lado, a crônica Cristo morto – dolorida
reflexão sobre o sentido da vida, manifesto pacifista, experiência íntima e
crua, expressão dramática e tocante, para dizer o mínimo –; do outro, projeções
de imagens do período. Cada um dos aparelhos telefônicos – que, diga-se de
passagem, entusiasmaram a muitos dos jovens visitantes da exposição por
serem-lhes um tanto “exóticos” – acionava uma gravação em áudio quando tirado do gancho, situando o ouvinte no tempo por meio de registros do noticiário e da
música popular da época. Lembrando que Rubem Braga foi o único jornalista que
testemunhou a “Rendição de Fornovo”, em que 14 mil soldados da 148ª Divisão de
Infantaria alemã entregaram-se ao Exército Brasileiro. Uma instalação de aviões
feitos de dobraduras de jornais – alusão evidente à Força Aérea Brasileira
também atuante naquele conflito mundial – que lentamente transformavam-se em
pássaros convidava o visitante a seguir para o próximo módulo: este
reproduzindo a lendária cobertura em que Rubem Braga viveu, no bairro de
Ipanema, no Rio de Janeiro.
Interiorano
saudoso, o cronista plantou um pomar sobre o edifício, para que desfrutasse ao
menos um pouquinho da vida agreste na cidade grande. Esse terceiro módulo da
exposição imitava a sala de estar de Rubem Braga. Sobre a mesa de centro, duas telas
mostravam em vídeo os testemunhos de amigos como Ana Maria Machado, DanuzaLeão, Fernanda Montenegro, Ziraldo e Zuenir Ventura, entre outros. Nessa mesma sala, retratos do autor – um deles
traçado por Cândido Portinari, outro por Dorival Caymmi –, assim como algumas
fotografias de encontros com amigos em sua cobertura lendária.
O penúltimo
módulo da mostra fazia uma alusão ao livro de crônicas O conde e o passarinho (1936), obra
de estreia do autor homenageado, trazendo uma projeção interativa em que passarinhos
pousavam, por meio de um jogo de sombras, nos visitantes. Rubem Braga, de fato,
foi um apaixonado por passarinhos (sou da turma dele). O último módulo trazia
instalações com fotografias e trechos de crônicas relacionadas à cidade natal
do autor, Cachoeiro de Itapemirim.
O rico acervo
da exibição – composto por textos, documentos, correspondência, medalhas,
cadernos de anotações, desenhos, pinturas, fotografias, rascunhos, objetos
pessoais, depoimentos e vídeos –, além de tratar-se de um farto material cedido
pela família Braga, também reunia documentos e fotografias que tinham sido
doados anteriormente à Fundação Casa de Rui Barbosa. Ao término das exposições
em São Paulo e no Rio de Janeiro, todo esse material segue para Cachoeiro de
Itapemirim, onde ficará em exibição permanente na casa da família do autor.
Rubem Braga faleceu em 19 de dezembro de 1990, acometido por um câncer na
laringe.
À parte de
o título da mostra ter sido evidentemente inspirado em Carlos Drummond deAndrade (O fazendeiro do ar, 1954), Marco Antônio de Carvalho, biógrafo de
Rubem Braga, após mais de dez anos dedicados a pesquisas, lançou o livro Rubem
Braga – Um cigano fazendeiro do ar (Ed. Globo, 2007), merecedor do Prêmio
Jabuti de melhor biografia em 2008. Foi essa biografia, obra da vida de seu autor, que certamente inspirou a curadoria a adotar o subtítulo da mostra.
Depois da visita ao Museu da Língua Portuguesa, a Produção Literária ainda esticou as pernas na Pinacoteca do Estado e, como reza a tradição, concluiu o passeio com uma saborosa pizza.
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